Direito do Trabalho é sempre uma seara polêmica. Hoje vamos discutir uma das situações mais inesperadas para o empregador: o abandono de emprego.
Quantos dias de falta do trabalhador configura esse abandono? O trabalhador tem direitos? Quais medidas deve tomar o patrão?
Veja abaixo considerações sobre a lei que rege essa situação tão surpreendente e incômoda.
O QUE CONFIGURA ABANDONO DE EMPREGO?
Segundo o artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o abandono de trabalho é uma das causas de rescisão do contrato de trabalho pelo empregador.
Configura abandono de trabalho a ausência injustificada por mais de 30 dias consecutivos por parte do colaborador. Esse é o prazo com que trabalha a jurisprudência trabalhista, porque a lei trabalhista não estabelece quantos dias de ausência injustificada pode motivar a rescisão por abandono de trabalho.
Portanto, o abandono de trabalho possibilita a demissão por justa causa. O tempo observado pode ser inferior a 30 dias, caso o empregador observe circunstâncias que provem a situação. É importante o patrão saber que, nesse caso, deverá apresentar as provas que evidenciem a intenção do trabalhador de não mais comparecer ao trabalho, o que pode gerar dor de cabeça.
QUEM PROVA?
Na verdade, o ônus da prova é SEMPRE do empregador, mas tentar apresentar os indícios antes dos 30 dias não é recomendável, porque esse é o prazo considerado pela jurisprudência.
É possível que 30 dias ou mais de faltas consecutivas não configurem o abandono de trabalho e não permitam que o empregador demita por justa causa. Isso porque a justificação pode ser feita pelo colaborador posteriormente. São situações extremas, mas que devem ser consideradas, como, por exemplo, a hipótese de o trabalhador ser internado e ficar impossibilitado de comunicar-se, ou ser preso.
A legislação trabalhista não discorre suficientemente sobre a questão de comprovação. Por isso, o empregador deve seguir algumas medidas antes de comunicar o abandono de emprego e poder rescindir o contrato.
COMO COMUNICAR?
Configurados os 30 dias de ausência injustificada, o empregador deve tem duas possiblidades formais. A primeira é a notificação pessoal, que pode seguir os seguintes passos:
- Notificar o empregado, solicitando a apresentação deste em prazo determinado, sob pena de demissão por justa causa em razão de abandono de emprego;
- Enviar a notificação como carta registrada e pedir aviso de recebimento;
- Realizar, caso o empregado não se manifeste no prazo determinado na notificação, a rescisão do contrato – as regras aqui seguidas são as mesmas da demissão por justa causa;
- Enviar o aviso de rescisão ao funcionário e, como forma de se resguardar, também pedir o aviso de recebimento.
Nesse caso, existe a possibilidade de o empregador ou algum membro de sua família não ser encontrado ou se recusar a assinar a notificação. A inexistência de assinatura faz com que não se configure prova.
Para ter mais segurança quanto à configuração de prova, o empregador pode fazer a notificação via cartório.
Aconselha-se que o empregador evite o anúncio de abandono de emprego via jornal, procedimento comum no passado. A exposição pública do empregado pode gerar, inclusive, ação por danos morais, o que significaria mais prejuízo para o patrão.
A EMPRESA PAGARÁ ALGUM DIREITO AO TRABALHADOR?
Sim, a empresa tem de quitar algumas pendências com o funcionário. São elas: o salário, ainda que com descontos, e o 13º salário, proporcional aos meses trabalhados. Esses pagamentos devem ser feitos até 10 dias após o fim do prazo para apresentação do empregado.
Existe a possibilidade de a empresa ter de pagar valor proporcional a 1/3 de férias, mas as decisões judiciais não demonstram haver consenso sobre o tema.
O QUE O TRABALHADOR PERDE?
O trabalhador dispensado por abandono de trabalho não cumpre aviso prévio, não recebe os 40% de multa do FGTS e NÃO FAZ JUS AO RECEBIMENTO DE SEGURO-DESEMPREGO.
E SE O TRABALHADOR REAPARECE?
Se, diante da notificação, o empregado reaparece, já não mais se configura o abandono de emprego.
Nesse caso, abrem-se as possibilidades, e é preciso ouvir a justificativa do funcionário. Se o empregador optar por dispensar o empregado, deve fazê-lo sem alegar a justa causa.
Diante de uma situação que pareça configurar abandono de emprego, o empregador deve ter a paciência de seguir os passos que configuram a produção de prova. Como você percebeu, a comprovação de que houve abandono de emprego não é tranquila e a lei não é específica quanto aos procedimentos que devem ser feitos.
Trata-se de uma situação atípica e desagradável, mas em relação a qual é preciso estar informado e tomar toda a cautela necessária, para evitar aborrecimentos na Justiça Trabalhista.